Setores da Marinha lutam contra Floriano Peixoto
Vitor Amorim de Angelo*
Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação
A Revolta da Armada foi um movimento deflagrado por setores da Marinha brasileira em 1893 contra o presidente da República, marechal Floriano Peixoto. Encabeçado pelo contra-almirante Custódio de Mello e pelo almirante Luiz Filipe Saldanha da Gama, o episódio expressou com clareza os interesses e as disputas políticas do início do período republicano.
Para compreender melhor a Revolta da Armada, contudo, é preciso retroceder ao governo anterior, do marechal Deodoro da Fonseca, e aos conflitos que levaram à sua renúncia, em novembro de 1891, com apenas nove meses de governo constitucional. O apoio de figuras associadas ao antigo regime político - a Monarquia - só acentuou as divergências e colaborou para reforçar a imagem de Floriano como consolidador da República.
As facções políticas estaduais
Quando a República foi proclamada, em 1889, um problema que imediatamente veio à tona foi a ascensão das oligarquias locais ao poder nos seus respectivos estados. Ocorre que havia elites em disputa pelo poder, e o presidente provisório, Deodoro da Fonseca, precisou decidir quem iria apoiar em cada estado. Com isso, logo as oligarquias desprestigiadas pelo novo regime, política ou economicamente, começaram a fazer oposição a Deodoro.
Esse movimento atingiu seu ponto alto na eleição presidencial de 1891, da qual Deodoro saiu vencedor. O vice-presidente eleito, porém, era Floriano Peixoto, apoiado pela oposição. Deodoro destituiu todos os governadores oposicionistas, nomeando políticos de sua confiança. Contudo, as bancadas estaduais no Congresso permaneceram as mesmas, e elas, em sua maioria, eram contra o presidente. Houve, assim, um descompasso entre os que detinham o poder nos estados e os representantes estaduais no Congresso Nacional.
Uma exceção foi o Rio Grande do Sul, onde a bancada federal apoiava o governador, Júlio de Castilhos. Quando, sob pressão, Deodoro renunciou, o vice, Floriano Peixoto, que assumiu a Presidência da República em novembro de 1891, destituiu os governadores que apoiavam Deodoro. Uma ferrenha disputa pelo poder instalou-se no Rio Grande do Sul, envolvendo o grupo de Castilho e as novas facções na luta pelo poder.
O movimento contra Floriano Peixoto
O presidente, que inicialmente manteve-se neutro, decidiu apoiar o governador que ele mesmo destituíra. Floriano sabia que, ao favorecer Castilhos, ganharia o apoio da bancada gaúcha no Congresso. De outro lado, os grupos que passaram a disputar o poder no Rio Grande do Sul, após a queda do governador, incluíram elementos identificados com a Monarquia. A oposição a Castilhos chegou a fundar o Partido Federalista Brasileiro, unindo dissidências do Partido Republicano local e integrantes do antigo Partido Liberal.
Em 1893, teve início a Revolta da Armada. Custódio de Mello, que havia apoiado Floriano na eleição para vice-presidente, não aceitou as medidas do governo em relação à política gaúcha. De outro lado, havia o problema sucessório. Pela Constituição, Floriano deveria convocar novas eleições no prazo de dois anos após a posse. Porém, isso não ocorreu. E Custódio, que era candidato à Presidência, ficou contrariado com a nova situação.
De maneira circunstancial, figuras associadas ao antigo regime também se juntaram ao movimento contra Floriano Peixoto - caso do almirante Saldanha da Gama, por exemplo.
A rebelião dos marinheiros, porém, não conquistou maiores apoios na então capital da República, Rio de Janeiro. Depois de algumas trocas de tiros com o Exército, os revoltosos seguiram para o sul do país. Parte deles desembarcou na atual cidade de Florianópolis. Chegaram a ensaiar uma aliança com os federalistas gaúchos - Custódio de Mello chegou a participar da Revolução Federalista -, mas o acordo não avançou.
Floriano Peixoto, que contava com amplo apoio dentro do Exército e mesmo entre as elites estaduais (sobretudo a paulista), adquiriu navios no exterior para reforçar o combate aos revoltosos, finalmente derrotados em março de 1894. Ao suprimir a Revolta da Armada, que de alguma forma vinculava-se à restauração da Monarquia - o presidente terminou por credenciar sua própria imagem como um radical defensor da nascente. República.
*Vitor Amorim de Angelo é historiador, mestre e doutorando em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Carlos.
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